O VAZIO DO INESPERADO A ANSIEDADE E A REALIDADE PANDÊMICA
Jun 24, 2022 5:32:49 PM Psicóloga Cleidiane da Silva Cruz – CRP: 11/15856 3 min de leitura

Cleidiane da Silva Cruz (CRP 11/15856)
Em 2020 foram confirmados os primeiros casos de covid-19 no Brasil. Toda a situação causou pânico, insegurança, medo, ansiedade, sono irregular, rotina comprometida, entre tantos outros sintomas gerais. Uma exaustão coletiva se instaurou. Há mais de um ano a pandemia é o principal motivo de sofrimento psicológico em todo o mundo. Dores causadas não apenas pelo luto, mas também pela instabilidade emocional em relação ao perigo.
O desconforto por muitas vezes pode provocar vontade de mudanças, mas a única alternativa que o tempo pandêmico sugere diz respeito ao oposto do que era de costume, é o que está mais distante da realidade vivida antes. É complicado conviver com a ameaça constante e a insegurança que essa doença provoca, além da incerteza e da dúvida sobre como será o futuro.
Diante da possibilidade, passamos mais tempo dentro de casa. O lar é esse ambiente que nos coloca diante das nossas próprias histórias: pensamentos, sentimentos e emoções que, diante de um acontecimento trágico, podem trazer consigo um imenso desconforto. Os feriados sempre podem ser os dias mais sofridos para alguns. Vai faltar um ente querido, o vazio vai surgir, e é o risco do qual mais se tem medo. O ruído da incerteza incomoda.
O que isso teria a ver com esse tempo? A psicanalista Maria Homem, em vídeo gravado para seu canal no Youtube (2020) reflete sobre o espaço que os feriados e datas festivas provocam na subjetividade. Ela fala que é nesses momentos em que a há o enfrentamento de si com suas próprias relações. É na solidão que o indivíduo se encontra e não por essa que ele pode desabar.
O desconforto pode paralisar, mas também aponta novas alternativas. São as mudanças que podem introduzir um recomeço. Uma reconstrução que coloca a vida como protagonista. É a criação que nos sustenta e a história que sustenta a criação. Imagine um sujeito sem histórias, ele está excluído de si mesmo, será autônomo dos sistemas que aprisionam. A relevância das historicidades dos fatos é o motor do barco que sustenta o nosso percurso na vida. Com a memória você passeia e amplia o olhar para as propostas e as palavras surgem: cuidado, atenção, esperança, recomeço.
A sugestão é entender o tempo novo ou o novo tempo. Organize-se em si mesmo, entendendo suas próprias lógicas, representando e criando espaços que oportunizem, não apenas uma inclusão social, mas também uma transformação ao que parece determinado ou sem solução;
Em “Mal-estar na civilização”, Freud diz que:
Boa parte da peleja da humanidade se concentra em torno da tarefa de achar um equilíbrio adequado, isto é, que traga felicidade, entre tais exigências individuais e aquelas do grupo, culturais; é um dos problemas que concernem ao seu próprio destino, a questão de esse equilíbrio é alcançável mediante uma determinada configuração cultural ou se o conflito é insolúvel. (2011, p.41)
Na medida em que o ser humano se desenvolve, cria novas formas de se sensibilizar e de atingir uma transcendência. Apesar de no mundo contemporâneo serem propagados discursos que nos afastem dessa experiência, que se trata de um presenciar heterogênico. Como Coli (2002) explora no texto “Notas sobre a experiência e o saber de experiência”, a Experiência é algo que predispõe e dispõe receptividade e transformação, que remete um percorrer, mas solicita um cuidado, algo da abertura e exposição.
Se a experiência é o que nos acontece e se o saber da experiência tem a ver com a elaboração do sentido ou do sem sentido do que nos acontece, trata-se de um saber finito, ligado à existência de um indivíduo ou de uma comunidade humana particular; ou, de um modo ainda mais explícito, trata-se de um saber que revela ao homem concreto e singular, entendido individual ou coletivamente, o sentido ou o sem sentido de sua própria existência, de sua própria finitude. (BONDÍA, 2002, p. 27)
Apesar de grandes perdas, nos dias atuais ainda é possível buscar alternativas de criação de novos projetos, de se reinventar, traçando formas de viver bem, mesmo em tempos tão difíceis. É a partir desse estranhamento que se pode haver o início da jornada de ressignificação, um caminho tortuoso que devolve o sujeito para si, esse passa a se reconhecer em si e também nos outros, percebendo, pois, que não segue sozinho, portanto ao gerar uma transformação individual e coletiva.